18 de dezembro de 2015

aos presentes

tamires sempre me diz coisas inteligentes. ela atravessa grades e crê no amor que não tem fronteiras nos artigos possessivos
um dia ela me disse que "o tempo é o verdadeiro presente, o mais valioso"

me disse que presentear tempo às coisas e às pessoas é estar. simples.
simples como um daqueles pensamentos que saem pingo a pingo de uma fenda, azeitando a pedra não acarinhada há muito, formando lábios com a lama que se acumula nas laterais. e num dia como esse, a fissura com lábios e língua se abre em boca imensa que não cala, inundando de rejeitos a sua rotina antes tão limpa.

um lamaçal de pequenos pensamentos tóxicos
rejeitados
que aumenta as distâncias - ou faz percebê-las, tanto faz
aceno a vocês da margem oposta, e penso que talvez pensem o mesmo


do pensamento:
que estamos perdendo tempo fazendo projetos de barcos que nos levem à outra margem
perdendo tempo fazendo cronogramas para não colher a madeira costurar a vela e talhar os remos ao mesmo tempo
perdendo o tempo fazendo tudo ao mesmo tempo
perdendo tempo tentando descobrir como vencê-lo, como ultrapassá-lo funcionalmente, comendo linhaça e misturando chia ao suco verde
perdendo o tempo calculando nossas horas extras
e comparando o valor de nossas horas (R$13, 96) empregadas em perda de tempo 
perdendo o tempo das rugas, dos tremores, das primeiras palavras, das últimas
perdendo o tempo na tentativa de esquecer que os cinco anos de um bebê não te fazem mais velho, mas fazem do bebê não mais um bebê

perdendo o tempo tentando encaixá-lo numa agenda da google

perdendo tempo pensando que estamos perdendo tempo
e querendo fazer algo com o tempo, escrever sobre isso

perdendo tempo até a lama secar e continuarmos pensando se vale a pena atravessar já que você nem acenou de volta