29 de julho de 2017

escritos antigos 1

O amor não é uma paixão, definitivamente. Não cheira à flor murcha, quase seca e nem tem o gosto das amêndoas amargas das paixões. O amor cheira à terra. É o solo das raízes, é a própria raiz. Pode ser encontrado facilmente: um farol numa maré baixa. A paixão se localiza bem mais distante da crista das ondas, abaixo, profundo, a paixão é o que move as ondas do dia seguinte.
Talvez assim: Os amores se dão nos pés, no chão fofo que cheira à vida. As paixões se dão nas abissais ocêanicas cuja aparência desconhecemos. É tudo uma questão de se olhar pro elemento.

escritos antigos 2

A depressão é algo como não desejar levantar, ainda que se deseje o resto, a todo momento. Algo como dizer que dia lindo e não ter vontade de sair. De comer. De abrir os lábios. A depressão é a própria sensação geofísica de um vale. Um lugar de onde nada se ouve ou vê, mas para onde tudo se ouve e vê. A depressão tem a ver com o que cai. Uns goles numa garganta, uns joelhos numas calçadas, umas lágrimas roladas, uns sais a mais numa comida que deveria ser doce, uns olhos atentos que afundam... todo um espírito que pesa no corpo como roupa encharcada depois da chuva.

8 de julho de 2017

attend to the bones

quando o espírito caleja é preciso voltar à pele
redescobrir as superfícies do mundo, dos homens, de mim

deixar ver, deixar ser vista
e sentida em minha composição primeira
que é pele, calor e sal

é necessário ser toda pele, e não mais que pele