18 de janeiro de 2018

interjeições

Ai!
ações e remendos e imprudências

Ai!
cautelas e vergonhas e orgulhos

Ai!
silêncios e falas demais

Ai!
todo esse tempo passado e esse presente nenhum

Ai!
o seu beijo, o seu abraço que me quebra em mil

Ai! 
o antever e o prever e o tomar cuidado pra não deixar partir

Ai!
esse falar de ti quando queria falar contigo

Ai!
ser menos do que sou, receber menos do que és

Ai!
esse desculpar-se tanto quando a culpa já nem existe

Ai! 
essa entrega pouca, esses olhos cobertos, essa alma que se esconde

Ai!
esses outros homens querendo tão mais que o possível

Ai!
essa burrice, essa besteira, essa estupidez

Ai!
esse amor que não cessa

Ai! 
essa vontade, essa falta de memória

Ai,
que se dane, que se dane.

B.O.

Entenda policial,

esse caso não é fácil, não é dos normais
nem é por mal que eu fico em silêncio
é por não ter o que dizer
apesar de me sentir digerindo um houaiss
depois de tudo
e tudo foi bastante, policial, acredite
as palavras fogem

é caso de prender, policial
aqui minhas mãos, aqui meus pés
autorizo o uso daquelas bolas de aço
trabalhos pesados, forçados
tudo que ocupe os pensamentos

camisa de força, é caso sério doutor
contenha os braços
me abraça, doutor
se não eu vou



sexo

que bom o sexo!

o não pensar tanto, 
o não sentir mais do que a respiração permite
melhor seriam os dois sentires 
sentir e sentir, as duas vertentes do ar
o ar que saí das pressões dos corpos
o ar que entra pelos apelos do coração
mas se sentir é o que há
que seja

que seja assim pele e suor que escorre
e um não cessar de lábios

que seja assim calor e frio
assim olhos abertos, fechados

assim uma exploração dos pólos de uma cama
assim uma exploração de superfícies

assim um desejar e se sentir desejada
como um corpo, que seja
como um sorriso beijado
um arrepio criado

ali uma deusa pagã 
no uso de suas forças
que chovem 
e molham
e irrigam a vida

e não mais
não mais

geografia

a geografia de um grande amor se parece com a geografia de uma grande cidade

é território imenso
cruzado por correntes de ar que refrescam e gelam
terra de muitas sombras e de sol a pino
de horizonte obstruído por distrações

curvas e subidas e ladeiras
paisagem de perder o olhar
de perder coisas de vista
como moedas em bueiros,
como palavras de amor cobertas pelos ônibus que freiam

nela há de brigas de trânsito
acidentes nas marginais
batidas policiais
ausências dos feriados

há uma multidão seguida de um vazio imenso

a geografia de um grande amor é uma colonização das fronteiras