22 de fevereiro de 2008

Abstraia-se

Você tem que fugir de onde você está!
Corra por campos imensos

Sinta o horizonte se aproximar
Veja aquilo que seus olhos não vêem
Já foi demasiado saturada daquilo que lhe é possível

Farte-se do surpreendente

Ilimite-se de possibilidades
Não é dever da quarta parede existir


Mas eu não consigo!


Se se convencer de suas limitações, as limitações de fato surgirão
Esqueça da vida real, dos momentos reais, das sensações reais, das histórias reais
A realidade só pode te atingir até que feche os olhos

E então, sob o aspecto de uma "viagem", fuja.

Me pede para pensar naquilo que não existe, fugir de tudo o que conheço.
Ou não pensar.
Me pede para esquecer o que já passou, sendo que a vida é feita de recordações.

Só porque você quer.


Tente esquecer então!

Quando preciso esquecer de algo ruim, é justamente o que insiste em permancer em minha cabeça.
Meus pensamentos não me obedeçem.

Ordeno: "Não quero pensar mais nisso!"
E começo a pensar em coisas diversas, em coisas inconcebíveis a momentos atrás.
E me pergunto: "Por que começei a pensar nisso?"
Para esquecer, PARA ESQUECER!

E nisso, me lembro.

Não é uma tarefa fácil esquecer.


Ninguém disse que era
O pensamento não precisa ser controlado
E sim, descontrolado
Não ordene.
Mantenha as coisas sob controle e responderá sempre em relatórios, cumprirá as mesmas obrigações e manterá suas possibilidades limitadas pela burocracia.
Tente descontrolá-las.

E como faço isso?
Enlouquecer-me conscientemente.

Pense no ato.
No momento.

Consequências, resoluções e antecedentes não existem na sua abstração.

Simples assim?

Serei então capaz de abrir-me ao mundo irreal que tanto fala?

Não apenas o mundo.

Conquistará galáxias inteiras.

-Quando?

-Quando se sentir ilimitada.
-Pode ser hoje?

-E as 24 horas não representam um limite para você?

-Não mais.

-Então, sim. Pode ser agora.
-Flutue comigo.
-Já estou no ar, meu bem.
-Já te alcanço!
-Demore o quanto for preciso.

-Mas e se....se eu demorar muito?
-Justamente o "se" te trará até aqui.
-Como?
-"Se" você fosse um pássaro, "se" você sentisse o vento te carregar, "se" você quisesse... Já estaria aqui, garanto.
-"Se" eu me esforçasse? "Se" eu abdicasse de tudo?
-"Se" você deixasse tudo dentro de uma caixinha... Te devolveria a chave depois.


Abstraia-se.


4 de fevereiro de 2008

CHEGA



A revolta termina em CHEGA
As brigas terminam em CHEGA
Os ultimatos terminam em CHEGA
Os desabafos terminam em CHEGA
Ou não terminam.

O CHEGA nunca é esperado.
E, se não é esperado, tem um choque maior.
Ou passa despercebido.

Mas o que, de fato, o CHEGA termina?
Chega o CHEGA a chegar alguma coisa?

"Chega de gritar!!!"
E ao pedir isso, gritamos.

O CHEGA leva à ordem, ao comando.
CHEGAs não são ditos cordialmente
Não são pedidos.

E, mesmo ordenado, o CHEGA não tem poder.
Continuaremos cometendo os mesmos erros.
"Eu não aguento mais isso! CHEGA!!!!"
Na maioria das vezes é pelo bem geral.
Mas ainda assim, é o bem imperativo.
"Chega de chorar."
Ninguém respeita ordens.
Ainda mais vindas de si mesmo.


CHEGA DE DIZER CHEGA!
O chega não basta.
Quando a loucura se apossa,
É foda continuar tentando ser
a outra pessoa.

Dedução.

Deduza-me,
Deduza o que não sinto,
E então me fará feliz.
Deduza o meu vazio,
E então me completará.
Deduza o que eu nego,
E então te direi sim.
Deduza meus desvios,
E eu mostrarei o caminho certo.
Deduza meus medos,
E então serei corajosa ao seu lado.

Deduza.
Minhas pistas
Meus estilos
Meus sorrisos
Meus toques
Deduza.
Meus gritos
Meu silêncio
Meus ímpetos
Minhas necessidades

Me deduze,
Me ajude a me deduzir.
Me deduza dos seus impostos, das suas perocupações.
Me deduza da vida, tão simples e perto.


E por favor,
Deduza esses meus pensamentos loucos.

2 de fevereiro de 2008

O mais, o menos, o não. Fazer.

Sabe o que é?
Não tenho o que fazer.

E por que você não tem?

Por que não quis.

E reclama agora?

Mas quando não quis eu não queria mesmo, e agora quero.

Então faça.

Agora já passou.

Então todos estão sem o que fazer agora?

É...

Então por que se sente tão mal?
Todos se sentem como você.

Não me sinto mal. Apenas... com menos coisas para contar.

E o que você me conta do que seu não-fazer?

Ouvi Autran recitando poesia, Balabanian encarnando Lispector, e Fitzgerald cantando suas angútias.

E quando fechou os olhos?

Ah...Andei descalça na areia, senti o sopro dos deuses no pescoço, o cheiro da chuva me dominou, ouvi atentamente os susurros ao meu lado, protegi os olhos para que os raios de sol não me machucassem a vista, abracei meus medos, distribuí lágrimas, cantei a vida.

...

Faça mais não-atos de vez em quando, ok?

Máscara pensante

Sento num sofá e ouço.
Quase como obrigação, me ponho a pensar.
O pensar necessário, porém indiferente no cotidiano.

Queria ter a prolixidade que tantos apresentam, que todos prezam.
E desmoronar palavras sobre as mentes, sobre os corações distráidos.
E fazê-los pensar também.

Queria também dizer em um olhar o que não se é dito em um livro inteiro.
A capacidade de emocionar.
O poder de arrepiar o coro cabeludo com um relato.

Queria ser Lispector.
E me deleitar confortável no pensamento dos que nunca pararam para pensar.

Nada do que digo parece palpável aos olhos dos que escutam.
Talvez erre ao tentar convencer.
A persuasão nunca foi um dos meus fortes.
E no entanto, prossigo justificando, e tentando me fazer entender.

Quando poderia ser entendida de tantos outros modos.

Talvez não deva argumentar ou questionar.
Afirmar parece ser a solução.
Mas se minhas afirmações buscam respostas, seriam então interrogações?
E a solução?

Estaria ela no fim
ou na resolução?
Na resolução final, no fim agradável?

Não há soluções, nem respostas que me satisfaçam.
E no entanto as busco sempre.

E a busca prossegue, atrapalhando meus pensamentos.
Aqueles que deveriam ser expostos.
E continuam atrás da neblina densa do "que fazer?", "como agir?" e "mas e se...?"

E a leveza solta dos pensamentos
De repente se torna dura, dolorosa.
Impede o agir, o prosseguir.



Quando no entanto, pensar é o próprio ato.