Quando o vazio esvazia-se, o que vem é o vácuo, e o vácuo oprime, pressiona, faz ser mais lógica a explosão do que o apaziguamento.
Abraço âncoras disfarçadas de bóias, mas escondida eu nado em direção à superfície. Sem braços laçando, sem pés batendo, nado com os olhos, a cada dia mais impermeáveis. Mas, devagar, eles afundam também. Afoga-se num mar de lágrimas secas e não enxerga mais o que antes era tão nítido.
Mas tenho de ser racional. Sou o menor dos problemas.
17 de outubro de 2010
talvez
Talvez a minha maior perda do período seja a perda da capacidade de explicação. A explicação, de certo modo, tornava o problema miniatura e, generosa, dava-me instrumentos para manipulá-lo. Não que o problema tenha deixado de ser brinquedo. Mas o brinquedo virou outro. Ou eu virei outra manipuladora. Como quando uma criança não sabe explicar porque o brinquedo se move ou como botam vida lá dentro. A diferença entre a criança e mim é que eu não me pergunto mais. Não faz diferença se há vida ali dentro. Apenas sento imóvel e o fito.
Olhar morto. Peixe morto – ou vivo, dentro de um aquário pequeno.
Olhar morto. Peixe morto – ou vivo, dentro de um aquário pequeno.
6 de outubro de 2010
No dia em que sofreu, qualquer cama teria espinhos. Os risos eram árvores entreabertas por raios, inertes diante da proposta do vento. Os suspiros - que só existem para fazer audível o que pode permanecer seu - só faziam endurecer a parafina derretida. As bocas que se estendiam em apoio só mostravam placas bacterianas e as carícias feitas só se faziam perceber se fossem seguidas pelos olhos. A água verteu apenas durante o tempo que seria convertido em litros e cobrado na conta de água no fim do mês e correu-lhe os dedos como que para convencê-los da sua materialidade. O beijo morno deitava em seu lábio mas este leito hanseníaco não incluía cobertor na hospedagem. Dormiu. Ou passou um certo tempo deitada até que o respirar - não suspirar - do vento sobre a cortina a fizesse abrir os olhos. Fechou-os. E seus olhos fechados piscaram durante a noite.
No dia seguinte ao dia em que sofreu, o céu embranqueceu.
No dia seguinte ao dia em que sofreu, o céu embranqueceu.
3 de outubro de 2010
Se o medo vier
de encarar os sentimentos de uma distância tão grande que se torne impossível encará-los,
de fazer curso de paraquedismo e sobre as nuvens querer chão,
da secura trincar o poço esvaziado,
do olho morto tomar lugar,
da resignação que de indício verdade se torna,
de chorar apenas pelas coisas certas,
do apenas,
que medo haverá?
de encarar os sentimentos de uma distância tão grande que se torne impossível encará-los,
de fazer curso de paraquedismo e sobre as nuvens querer chão,
da secura trincar o poço esvaziado,
do olho morto tomar lugar,
da resignação que de indício verdade se torna,
de chorar apenas pelas coisas certas,
do apenas,
que medo haverá?
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